sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

CONVERSA SOBRE O TEMPO








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CONVERSA SOBRE O TEMPO

Avelina Maria Noronha de Almeida


Ainda sob os eflúvios do ano que começa, quando inauguramos um novo tempo e estamos cheios de boas intenções de aproveitá-lo da melhor maneira possível, vamos jogar um pouco de conversa sobre este assunto que sempre interessou as pessoas, preocupou os filósofos e os cientistas, principalmente quanto ao modo de bem aproveitá-lo.

Somos arrastados por este fluir constante, que não podemos deter. É por isso que devemos seguir o conselho do poeta italiano lírico, satírico e filósofo:
“Carpen diem, quam minimum crédula postero” (Aproveita o dia presente e não queiras confiar no de amanhã).

Ou ouvir o alerta do poeta e prosador alemão Goethe:

"Cada momento, cada segundo é de um valor infinito, pois ele é o representante de uma eternidade inteira”.

Também o poeta e prosador espanhol Quevedo fala com muita beleza e sabedoria: "Sabes tu, porventura, o que vale um dia? Conheces o preço de uma hora? Examinaste, já, o valor do tempo? Decerto não, porque o deixas passar, alegre, descuidado da hora que, fugitiva e secreta, te leva preciosíssimo roubo. Quem te disse que o que já foi voltará, quando te for preciso, se o chamares? Dize-me: viste já alguma pegada do dia? Não! Ele só volta a cabeça para rir e zombar daqueles que assim o deixaram passar".

Muitas outras mentes privilegiadas já abordaram o assunto dizendo o que é o tempo e como utilizá-lo sabiamente, porém o que mais me deixou marcas ao ler foi a história contada pelo escritor russo Tolstoi.

Narra ele que um rei, para bem governar, queria saber a melhor hora de começar tudo, quais as pessoas certas a escutar e a quem evitar e, acima de tudo, qual a coisa mais importante a se fazer.

Proclamou pelo reino afora que daria uma grande recompensa a quem lhe desse esses ensinamentos. Vieram muitos estudados darem respostas diversas ao soberano, mas nenhuma delas o satisfez. Não concordando com nenhuma delas, a ninguém recompensou.

Um dia soube da existência de um eremita famoso pela sua sabedoria, que vivia em um bosque do qual nunca saía e onde recebia somente a gente do povo. Vestiu roupas comuns e, antes de chegar ao abrigo, deixou para trás seu cavalo e sua guarda.

O eremita, com a respiração pesada, pois era muito frágil e fraco, estava cavando com uma pá o solo em frente à sua cabana. Olhou para o rei, cumprimentou-o e continuou cavando. O rei se aproximou e fez-lhe três perguntas:

- Como posso aprender a fazer a coisa certa na hora certa? Quais as pessoas de que mais necessito e às quais devo, portanto, prestar mais atenção do que ao resto? E quais são os assuntos mais importantes e que exigem primeiramente a minha atenção?

O eremita escutou mas não respondeu, recomeçando a cavar.

O rei, vendo que o velho estava cansado, pediu-lhe a pá e passou a cavar em seu lugar. Depois de ter cavado dois canteiros, repetiu a pergunta. O velho nada lhe respondeu, só mandando que descansasse e lhe deixasse trabalhar de novo. O rei não entregou a ferramenta e continuou a cavar por mais de duas horas até que foi entardecendo e ele fincou a pá no chão dizendo ao eremita que ali estava em busca de respostas e que, se ele não podia dá-las, iria voltar para sua casa.

De repente,o velho disse:

- Olhe! Aí vem alguém correndo.

O rei virou-se. Um homem de barba tinha saído correndo do bosque, com um ferimento de bala no estômago, todo ensangüentado, caindo desmaiado. Ele e o eremita o socorreram. O rei lavou o ferimento cuidadosamente. O sangue não parava de correr e ele sempre trocando a bandagem que fizera, lavando-a e atando-a novamente. Finalmente o sangue parou de correr, o homem pediu água, que o rei lhe trouxe fresca. Carregou o ferido para a choupana, deitando-o na cama. O ferido adormeceu e o rei, sentado a seu lado, estava muito cansado e também adormeceu. Dormiram a noite inteira. Ao acordar, de manhã, o rei surpreendeu-se com o ferido a fitá-lo e a pedir-lhe perdão.

- Mas eu não o conheço, não tenho nada a perdoar...

Foi então que o homem contou a sua história. Era irmão de um homem que o rei mandara executar e se apossara de suas terras. Ele jurara vingar o irmão. Quando soube que o rei iria visitar o eremita sozinho, ficou num esconderijo esperando a sua volta. Como o dia passou e ele não voltava, saiu do esconderijo e resolveu ir ao seu encontro, mas os guardas, que estavam a uma certa distância da casa do eremita, o viram, reconheceram que era um inimigo e o feriram. Iria morrer se o rei não o acudisse e cuidasse dele.
O rei ficou feliz de ter feito as pazes com ele e não só o perdoou como disse que devolveria suas propriedades. Depois dirigiu-se ao eremita, que estava ajoelhado espalhando semente nos canteiros, rogando-lhe, pela última vez, que respondesse às perguntas que tinha formulado.

Vou deixar o restante da história para ser relatado pelo próprio Tolstoi:

"- Você já obteve as respostas – disse o eremita, ainda ajoelhado, olhando para o rei parado à sua frente.

- Como? O que você quer dizer? – perguntou o rei.

- Você não vê – replicou o eremita. Se ontem você não tivesse se apiedado da minha fraqueza e não tivesse cavado estes canteiros para mim, e tivesse voltado, aquele homem o teria atacado e você teria se arrependido de não ter ficado comigo. Então a hora mais importante foi a hora em que você estava cavando os canteiros; e eu fui o homem mais importante; e fazer o bem para mim foi o seu assunto mais importante. Depois, quando o homem correu em nossa direção, a hora mais importante foi a hora em que você o estava atendendo, pois se você não tivesse cuidado dos ferimentos dele, ele teria morrido sem fazer as pazes com você. Então ele foi o homem mais importante, e o assunto mais importante foi aquilo que você fez por ele. Então lembre-se: existe apenas uma hora que é importante porque é a única hora em que possuímos algum poder.”



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