domingo, 12 de janeiro de 2014

A POESIA EM TEMPO DE CRISE











Imagem da Internet






A POESIA EM TEMPOS DE CRISE

Avelina Maria Noronha de Almeida



Corriam os terríveis tempos da Segunda Guerra Mundial. Grande parte da humanidade via-se coberta pelas sombras da tirania, sofrendo ameaças terríveis ou vivendo uma realidade onde o sofrimento, a tortura e a morte eram presença constante. Crise de valores morais, crise de liberdade e crise de dignidade.

De repente, no dia 5 de junho de 1944, versos da Canção de Outono, de Paul Verlaine, foram lançados aos ares pela BBC de Londres. Mais uma vez, mais outra... Eis os versos cujas insistentes repetições puseram em alerta os aliados:

“Os longos gemidos
Dos violinos
Do outono
Ferem meu coração
Com monótona
Languidez.”

Os versos eram melancólicos, eram doridos, mas, paradoxalmente, traziam um raio de esperança, a mensagem alentadora de que algo muito importante ia acontecer, o que poderia trazer paz à face do mundo. Eles eram a combinada e esperada senha que anunciava estar próxima a hora do desembarque, na Normandia das forças aliadas, o famoso DIA D, e que as tropas deviam ficar alertas e se prepararem para o início de uma trajetória heróica, que restabeleceria a liberdade e a dignidade humana dos países invadidos pelo Nazismo.

Tal fato aconteceu, realmente, no dia seguinte, 6 de junho de 1944. Por que teriam escolhidos versos para aquela mensagem? Talvez porque a poesia alimente o coração com a esperança e, naquela situação, despertaria as forças da alma como se fosse um clarim convocando à luta... A poesia pode ser a denúncia contundente, que pela lírica se imortalize...

Foi o que fez, pela sátira, Gregório de Matos Guerra (1636 - 1695), alcunhado de Boca do Inferno ou Boca de Brasa, em sua visão da Bahia, no Brasil Colônia.

“Que falta nesta cidade? Verdade.
Que mais por sua desonra... Honra.
Falta mais que se lhe ponha? Vergonha.

O demo a viver se exponha
Por mais que a fama a exalta,
Numa cidade onde falta
Verdade, Honra, Vergonha.”

Ou o que encontramos nas Cartas Chilenas, poemas em forma manuscrita e anônima, que atacavam frontalmente o governador e outros mandatários.

“Agora, fanfarrão, agora falo
Contigo e só contigo. Por que causa
Ordenas que se faça uma cobrança
Tão rápida e tão forte contra aqueles
Que ao erário só devem tênues somas?

O pobre, porque é pobre, pague tudo,
E o rico, porque é rico, vai pagando
Sem soldados à porta, com sossego?
Não era menos torpe e mais prudente
Que os devedores todos se igualassem?”

Mas nada se compara em força dramática de denúncia a Castro Alves, inspirado poeta, como podemos ver em “O Navio Negreiro”:

“Senhor Deus dos desgraçados!
Dizei-me vós, Senhor Deus!
Se é loucura... se é verdade
Tanto horror perante os céus?!
Ó mar, por que não apagas

Côa esponja de tuas vagas
De teu manto este borrão?...
Astros! Noites! Tempestades!
Rolai das imensidades!
Varrei os mares, tufão!"

É, assim, a imponderável poesia um das mais belas manifestações do sentimento humano, com sua força para sensibilizar e deixar marcado o espírito de uma época.





Nenhum comentário:

Postar um comentário