domingo, 29 de dezembro de 2013

SERIAM OS NOSSOS CARIJÓS DESCENDENTES DOS CELTAS?








Civilização Celta

Imagem da Internet



SERIAM OS NOSSOS CARIJÓS DESCENDENTES DOS CELTAS?

Avelina Maria Noronha de Almeida


PARTE I


OS QUASE DESCONHECIDOS PRIMEIROS DONOS DE NOSSA TERRA


No site da cidade paulista de Itu, antiga aldeia dos Carijós, num artigo escrito há pouco dias sobre esses aborígenes, ali presentes no princípio da história daquele lugar, o articulista termina fazendo um pedido a seus conterrâneos: “Neste Dia do Índio, nós ituanos, bem podemos voltar nossa atenção para aqueles irmãos que habitavam nosso pedaço antes de existir Itu, os Carijós...” Achei muito interessante e resolvi, cá de longe, seguir o exemplo do ituano e voltar minha atenção para os nossos Carijós.

Em nossa cidade, pouco se sabe dos primeiros donos de nossa terra. O que eu aprendi na escola e ensinei a meus alunos de curso primário nada mais foi que os índios Carijós, pertencentes ao grupo lingüístico tupi-guarani, fugindo à hostilidade de outras tribos e à prepotência do homem branco, saíram da Baixada Fluminense, transpuseram a Serra do Mar, subiram a Mantiqueira e, chegando aqui, fizeram o seu pouso, que foi chamado Campo Alegre dos Carijós. Também sabemos que a primeira notícia que se teve da nossa terra foi que uma bandeira paulista viu um aldeamento de índios Carijós e mineradores que garimpavam nas faldas da Serra de Ouro Branco e que os índios ajudaram a construir a primeira igreja. E a taba dos Carijós era na praça Barão de Queluz, em frente à Matriz, fato que eu coloco em dúvida. Era mais ou menos isso.



Óleo em tela da pintora lafaietense Marília Batista Albuquerque

Arquivo Pessoal

Há alguns anos, a pedido da renomada pintora Marília Batista Albuquerque, pesquisei sobre os Carijós e achei, na Biblioteca Municipal, uma informação dada pelo historiador mineiro Lúcio Costa de que eles eram originários do norte do país, da Amazônia. Seus traços eram delicados e, de acordo com o mesmo historiador, alguns tinham olhos azuis. Seu temperamento brando, eram os mais mansos numa escala de agressividade das tribos e tinham relação amigável com os homens brancos. As mulheres eram as mais belas da gentilidade. Marília pintou dois quadros belíssimos: num deles um índio Carijó no meio da mata, colocado no Clube Carijós; no outro, uma índia numa lagoa, tendo olhos azuis segundo a informação do historiador.

Depois encontrei mais alguns dados na “História de Minas Gerais”, livro editado pela Imprensa Oficial de Minas Gerais”, onde Lúcio Costa diz que uma horda de carijós subiu o Vale do Rio Paraibuna, vindo do litoral, estabelecendo-se nos Campos de Queluz e Congonhas. Observa ele que esses índios “assentavam suas aldeias à beira d’água, nos sítios mais favoráveis à obtenção de alimentos”.

Atualmente recolhi muitos dados interessantíssimos sobre nossos índios, que confirmam as informações do historiador mineiro. Em registros feitos pelos cronistas coloniais, quando os portugueses chegaram ao Brasil, “os carijós foram apresentados como um reconhecimento feliz, enquanto os tupiniquins, um reconhecimento infeliz”. E dizem também que as primeiras impressões decorrentes do contato inicial entre europeus e gentio mostram os carijós como índios “dóceis, bondosos e bonitos”

As cartas dos jesuítas também são preciosa fonte de informação sobre o gentio que iniciou a história de Conselheiro Lafaiete. Em 1549, Nóbrega envia aos seus irmãos em Coimbra a “Informação das Partes do Brasil”: “Percebe-se que a descrição do gentio segue uma tipologia que ordena as diferentes ‘castas’ mediante um ponto comum: a nudez. Cria-se uma escala gradativa de nudez, de um lado os carijós, que vestem algodão, vistos como um ‘gentio melhor’, e de outro os Gaiumurés, dotados de sinais monstruosos (gigantes) em que a nudez, ressaltada por adereços perfurantes, faz com que se pareçam ‘demônios’.”





Imagem da Internet


PARTE II



A FASCINANTE HISTÓRIA DOS CARIJÓS


“... a riqueza de uma obra – de uma geração – é sempre determinada pela quantidade de passado que contém.” Cesare Pavese, em O Ofício de Viver


Estou ficando fascinada com a história dos Carijós! Cada vez mais encontro referências interessantes sobre os primeiros habitantes de Conselheiro Lafaiete.
Lúcio Costa diz que vieram da Amazônia, fato confirmado por leituras diversas que tenho realizado, principalmente de documentos como as cartas que os jesuítas, nos primeiros tempos do nosso País, escreviam para Portugal.

Muitas fontes sobre a história dos Carijós são aquelas que se referem à diáspora amazônica dos Carijós. Usado quando se refere à dispersão dos judeus pelo mundo no decorrer dos séculos, diáspora é um termo que vem do grego Diáspora (dispersão) e é também usado significando dispersões da emigração de outros povos. Assim, é também aplicado à vinda dos africanos para serem escravos no Brasil e à saída dos índios da Amazônia em direção ao restante do País.

Aníbal de Almeida Fernandes estima que, na época do Achamento do Brasil, em 1500, ficava entre “500.000 e 1 milhão o número dos índios que habitavam o Brasil e que pertenciam, predominantemente, à família Tupi-Guarani. que no início da era cristã viera das margens dos rios Madeira e Xingu (afluentes da margem direita do Amazonas) numa migração pelo litoral; por conta do aumento populacional povoa o litoral e, com um certo fundo religioso à procura de uma suposta Terra sem Males, eles, além de caçadores e coletores, exerciam uma incipiente agricultura de mandioca, feijão, milho e cará, sendo mais evoluídos do que os Tapuia (Jê), apenas coletores e caçadores, considerados pelos Tupi como tribos bárbaras que foram expulsos para o interior”.

Segundo o mesmo autor, os índios brasileiros do litoral dividiam-se em 11 grupos: Potiguar, cerca de 90.000; Tremembé (grupo não tupi), cerca de 20.000; Tabajara, cerca de 40.000; Kaeté (=filhos da mata), cerca de 75.000; Tupinambá (=os pais de todos), cerca de 100.000, e eram Tupi por excelência podendo-se considerar as demais tribos como seus descendentes; Aimoré, ou Botocudo (grupo não tupi), cerca de 30.000; Tupiniquim (=filhos dos tupis) cerca de 85.000; Temiminó, cerca de 10.000; Goitacá (grupo não Tupi) cerca de 12.000; Tamoio (=os avós) cerca de 70.000; Carijó, cerca de 100.000, que eram os mais submissos e amistosos. E havia os Tapuias (=os outros). Como se pode ver, era uma tribo numerosa, só igualada em quantidade de índios pela dos Tupinambás.

Os índios Carijós, os índios Carijós saíram da floresta amazônica em direção ao litoral, erguendo, pelo caminho, várias aldeias, que eles chamavam em sua língua (uma mistura de tupi e guarani) de Koty (Cotia), “casa”, “ponto de encontro”. Dizem uns que era por serem os seus caminhos sinuosos, como o trajeto feito pelas cotias. Outros já associam o termo como Acutia, em tupi-guarani “caminhos agudos”, por haver na região grandes morros.

Foram sempre descendo pelo litoral e criando novas aldeias, até chegar no litoral do Sul. Algumas dessas aldeias, hoje cidades, ainda conservam o nome original dado pelos aborígenes Carijós (Karai-yo), como Cotia, em São Paulo , ou Cotia, em Santa Catarina.

Considero muito importante conhecermos melhor os índios que habitaram nossa terra, e inda há muita coisa interessante sobre eles.





João Barcellos, escritor português radicado no Brasil

Imagem da Internet




PARTE III


JOÃO BARCELLOS E O OLHAR CELTA

“A pesquisa é a arte de criar dificuldades fecundase de criá-las para os outros. Nos lugares onde havia coisas simples, faz-se aparecer problemas”.
Pierre Bourdieu


Na série de artigo sobre os índios Carijós, antes de continuar com detalhes mais informativos e documentais sobre o primeiros habitantes, vou viajar no tapete mágico das hipóteses, usando, para isso, um texto muito interessante de João Barcelos: ”UM OLHAR CELTA entre a península ibérica e o mundo”.

Verdade? Fantasia? Hipótese bem provável? Ou como disse Bourdieu, nos lugares onde havia coisas simples, fazer aparecer problemas? Deixo, a quem ler o Garimpando de hoje, o trabalho de tirar suas próprias conclusões.

João Barcellos é um escritor português há muitos anos radicado no Brasil. É um estudioso da luso-brasilidade e escreveu quatro livros sobre o assunto: “O Outro Portugal (romance) e três estudos históricos, dois deles (“Cotia – Da Odisséia Brasileira De São Paulo Nas Referências Do Povoado Carijó, SP- 1996” e “De Costa A Costa Com A Casa Às Costas, SP-1996) sobre os índios Carijós, que foram os primeiro habitantes da cidade de Cotia, na Grande São Paulo, onde ele reside.É membro da União Brasileira de Escritores (UBE), membro correspondente do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina editor de jornais de âmbito nacional, de outras associações e desenvolve vários outros trabalhos culturais.

Coloquei neste texto a biografia do escritor luso-brasileiro para demonstrar, pelas suas referências, a seriedade das pesquisas e dos escritos do autor sobre os índios carijós.

Vou começar transcrevendo um trecho de “O Olhar Celta”:

“A parte portuguesa que diz dos povo genericamente denominados como Celta, ou da influência céltica, é realmente muito forte em todo o território – território, aliás, de velhas fronteiras levantadas a espadeirada e quente azeite, salteio e bandeiras e, quiçá, as mais antigas fronteiras estabelecidas institucionalmente no mundo.

Quando da descoberta e posterior estudo arqueológico das vilas muradas – ou castros, ou citânias -, por Martins Sarmento, a partir de Briteiros e Sabrosa, na região portuguesa de Guimarães, estas transformaram-se nos mais importantes sítios arqueológicos do período pré-céltico e céltico, e Portugal pôde, enfim, reencontrar parte da sua estrutura sociocultural mais profunda: a Civilização Celta.”

Antes de continuar a análise do texto, vamos relembrar quem eram os celtas. Era um povo que habitava a Europa antiga, mais ou menos organizados em tribos, vivendo agricultura e da caça. A partir do século VIII a.C., espalharam-se nos territórios onde hoje ficam Áustria, República Tcheca, França, Alemanha e Suíça. Invadiram a Itália em 390 a .C. invadiram a Itália e ocupando Roma por algum tempo e, em 250 a .C., invadiram os atuais territórios dos seguintes países: Bulgária, Hungria, Romênia, Grécia, Turquia, Portugal, Espanha e Ilhas Britânicas, mas foram derrotados pelos romanos entre 58 e 52 a .C. na Europa continental e em 43 d.C. nas Ilhas Britânicas. Encontrei, na enciclopédia Conhecer da Abril Cultural, um trecho que fala sobre os celtas e me despertou a atenção:

“Povo que, ainda no século XVI antes de Cristo, abandonou a planície centro-européia e atravessou o mar. O que foi um ato de coragem, pois viajar era muito difícil naquela época. Mas os celta do grupo gaélico tinham ânimo forte e não hesitaram em se lançar ao mar para conhecer a ilha, onde chegaram e ficaram com o firme propósito de se fixar, crescer e multiplicar-se. De preferência em paz.”

Analisando esse trecho sobre a epopéia dos celtas, percebi que, trocando apenas algumas palavras, podia o trecho se aplicar ao deslocamento dos nossos Carijós: Povo que, no século XVII, abandonou a baixada fluminense e transpôs a serra do Mar. O que foi um ato de coragem, pois atravessar matas ínvias, sofrendo as agruras de tal empreitada era muito difícil. Mas os Carijós tinham ânimo forte e não hesitaram em se lançar à selva e conhecer a nossa terra, onde chegaram e ficaram com o firme propósito de se fixar, crescer e multiplicar-se. De preferência em paz.

Faria parte, do deslocamento dos Celtas pelo mundo, a diáspora amazônica dos Carijós?

João Barcellos prossegue em suas conjecturas.

“Os sítios arqueologicamente trabalhados por Martins Sarmento situam-se no norte, mais precisamente na região onde também D. Afonso Henriques iniciou o estabelecimento do Reino após tornar-se independente dos castelhanos com uma vitória sobre a própria mãe... Não foi isso um acaso, mas (um)a certeza da força cósmica ali deixada pelo Celta e que sobreviveu à romanização e à catequese cristã. Interpretar a forma de civilização carregada pelos povos Celta para a Península Ibérica é, de certa maneira, interpretar muito da alma portuguesa, aquela do ‘peito aberto ao mundo’... É interessante (a)notar este ponto de identidade com o Carijó, um dos povos da floresta amazônica, que em sua digressão pelo interior e pelo litoral do chamado Brasil construía em seus ‘altos’ a koty (cuty, acutia – como grafou Hans Staden em seu relato -, cotia), uma palhoça redonda; Koty, que no tupi-guarani significa ‘ponto de encontro’ ou ‘a casa de’ (como registrei em meu opúsculo ‘De Costa a Costa Com a Casa às Costas’) e que para esse povo tinha o mesmo significado de pátria que se encontra na interpretação do castro céltico. (...) Aquele olhar celta abrangia, na verdade, o mundo, e este era, na vera concepção da vivência-sobrevivência, a dilatação pátria do seu peito aberto!”

De acordo com o escritor luso-brasileiro, os povos ibéricos receberam a influência dos povos fenícios, e “o Povo Fenício não era mais do que uma das facções da Civilização Celta, facção essa que deu origem, numa cisão social memorável, às amazonas (há-mâs-ohne: as sem macho) – hoje, arqueologicamente reveladas e não pertencendo mais ao ‘reino da fantasia’ (e dando razão às certezas históricas já anteriormente apontadas por D’Olivet)... Do rei D. Afonso Henriques ao rei D. Diniz a Nação portuguesa fortaleceu-se territorial, social e culturalmente. Tornou-se uma Nação de fato e de direito. Mas isso não bastava aos portugueses, como não bastou aos celtas e aos celtiberos. Era preciso continuar a olhar, e a olhar com aquele velho e renovado olhar celta. O que aconteceu com o rei D. João II, um estadista que quis e fez da sua Pátria a alma de um Povo ousado”.

Achei muito interessante o texto de João Barcellos. E bonito! Imaginei uma onda humana de espírito aventureiro, desbravador, aquela “força cósmica” dos celtas passando pela Europa, chegando a Portugal, ocupando até o nosso Brasil... e mais!... chegando à nossa pátria pequena, transformando-a no Campo Alegre dos Carijós; dispersando-se pelas terras de Minas quando o ouro se tornou escasso, espalhando-se mais ainda em busca de expansão, de novos horizontes para progredir, mas sempre deixando, em cada “castro” ou “cotia”, uma porção do seu espírito empreendedor. Porque nós somos profundamente Carijós. Foi com o sangue desse indígena que se construiu a nossa identidade, e ele está cada vez mais se espalhando pelas gerações que se sucedem. Isto é um fato comprovado. De acordo com estatísticas da época, na primeira década do século XVIII, apenas 10% dos nascimento na região das minas era de filhos legítimos, porque no, início da colonização, raríssimos portugueses traziam a família, havendo, assim, poucas mulheres brancas. As mulheres índias, que na época eram de um número considerável, foram as grandes responsáveis pela miscigenação e conseqüente espírito empreendor, progressista e expansionista do lafaietense.

No princípio, considerei apenas uma fantasia as teorias de Barcellos. Entretanto, o assunto ficou me perturbando e passei a fazer as minhas próprias pesquisas. Encontrei muitas coincidências. Vejam só!

Primeiramente procurei entender como seria a ligação dos celtas com o solo brasileiro. É claro ter vindo no sangue dos colonizadores portugueses, mas para serem os carijós um povo celta, algo teria acontecido antes do descobrimento do Brasil, pois eles já viviam na Amazônia quando Cabral chegou. Encontrei coincidências bem fortes.

Fiquei sabendo que antiga lenda céltica de uma insulla Brasil era citada por marujos celtas e aparecia em mapas-mundi antigos, como o de Bartolomeu de Pareto (1455).






Imagem da Internet


PARTE IV

HY BRASIL



“... Quanto, Senhor, ao sítio desta terra, mande Vossa Alteza trazer um mapa-múndi que tem Pero Vaz Bisagudo e por aí poderá ver o sítio desta terra...”
Mestre João

Segundo uma lenda muito antiga, havia um lugar chamado Hy Brazil, que teria sido descoberto e colonizado por São Brandão, monge irlandês que partira para o mar em 565, aos 105 anos, em busca de um lugar para dedicar-se a Deus. Tal lugar abençoado foi procurado por muito tempo e há quem ache que o nome de nossa pátria possa ter sido inspirado pela lendária ilha do monge.

De acordo com pesquisas do historiador Sérgio Trombelli, na antiga língua celta “braazi” queria dizer “terra grande” e os celtas estariam em nossas origens. A Insulla de Brazil foi citada por Bartolomeu de Pareto em 1455 e no mapa de Pero Vaz Bisagudo, também anterior à viagem de Cabral.

Mestre João Farás, médico, astrônomo, astrólogo e físico espanhol participante da expedição cabralina, e que nomeou a constelação do Cruzeiro do Sul realizando as primeiras observações astronômicas em terras brasileiras, em carta escrita em 28 de abril de 1500 para el-rei D. Manoel diz o seguinte: “... Quanto, Senhor, ao sítio desta terra, mande Vossa Alteza trazer um mapa-múndi que tem Pero Vaz Bisagudo e por aí poderá ver o sítio desta terra...”

É interessante que os celtas tinham governos regionais em cada aldeia, o que lhes daria melhores condições de sobrevivência. Equivaleria aos “castros” em Portugal e às “cotias” no Brasil, citados na edição anterior deste jornal. Tudo não passa de hipótese, mas há muitas coincidências. E é tão bom fantasiar, às vezes...

Outro fato que se pode relacionar à presença céltica no Brasil é o mito das Amazonas. Havia, entre os celtas, uma classe de mulheres guerreiras, que já foram relacionadas às mitológicas amazonas do norte do Brasil.

Em 1541, Gonzalo Pizarro, naquela época governador de Quito, no Equador, associando-se ao capitão Francisco de Orellana, partiu da cordilheira dos Andes, a pé, acompanhando o trajeto dos rios formadores do Amazonas, em busca do Eldorado (El Dorado), um lugar de fabulosas riquezas, numa expedição composta de 300 espanhóis e cerca de 4.000 índios. Depois de viajar 70 dias, em local difícil de obter alimento, Pizarro desistiu e voltou para Quito, porém Orellana resolveu prosseguir, levando 55 soldados e dois frades, um deles Frei Gaspar de Carvajal, que relata a viagem em uma crônica posterior que teve enorme repercussão na Europa e no resto do mundo daquela época.

As margens do rio eram densamente povoadas. Numa aldeia, encontraram uma praça com grande escultura em relevo figurando, sob dois leões, uma cidade com altíssimas torres, tendo sido informados que os habitantes daquela aldeia eram “súditos e tributários das Amazonas” às quais forneciam penas de pássaros. No centro de uma praça, havia um oratório em homenagem à governante das amazonas.

Quando penetraram no território das fabulosas mulheres, já eram esperados. Vejamos um trecho da narrativa de Frei Gaspar:

“Íamos desta maneira caminhando e procurando um lugar aprazível para folgar e celebrar a festa do bem-aventurado São João Batista, precursor de Cristo, e foi servindo Deus que, dobrando uma ponta que o rio fazia, víssemos alvejando muitas e grandes aldeias ribeirinhas. Aqui demos de chofre na boa terra e senhoria das amazonas. Estavam estes povos já avisados e sabiam da nossa ida, e por isso nos vieram receber no caminho por água, mas não com boa intenção. Chegando perto, como o Capitão os quisesse trazer à paz, começando a falar-lhes e a chamá-los, riram dele e faziam burla de nós: aproximavam-se e diziam que andássemos, pois ali abaixo nos esperavam, para prender-nos a todos e levar-nos às amazonas.”

Foi quando houve intensa luta entre soldados e os índios que estavam acompanhados de algumas mulheres.






Imagem da Internet



PARTE V

AS AMAZONAS

Arte e vida se misturam.
Fantasia e realidade se acrescentam.

Affonso Romano de Santana


Como Orellana e seus acompanhantes se arranjaram diante dos índios no território das Amazonas?

O Padre Carvajal conta que houve uma terrível luta contra os índios e também com algumas das mulheres que teriam vindo em socorros dos tributários das Amazonas.

Mais um trecho de sua carta:

“Estas mulheres são muito alvas e altas, com o cabelo muito comprido, entrançado e enrolado na cabeça. São muito membrudas e andam nuas em pelo, tapadas as suas vergonhas, com seus arcos e flechas nas mão, fazendo tanta guerra como dez índios. E em verdade houve uma destas mulheres que meteu um palmo de flecha por um dos bergantins e as outras um pouco menos, de modo que os nossos bergantins pareciam porco espinho.”

O padre continua o relato e diz que, embora vários índios comandados pelas mulheres e mesmo algumas delas tivessem sido abatidos, a situação era difícil e os soldados tiveram que fugir, antes capturando um índio. Este contou que pertencia a uma tribo cujo chefe, Conyunco, senhor de toda a área próxima à foz do Rio Nhamundá, era súdito das mulheres que residiam “a sete jornadas da costa”. A tribo devia obediência às mulheres guerreiras, às quais pagavam tributo. As amazonas não tinham maridos e eram em grande número. O índio conhecia cerca de trinta aldeias, cercadas, e ninguém entrava nelas sem pagar tributos. Habitavam casas de pedras com portas. Capturavam índios em guerras para deles terem filhos. Quando engravidavam, descartavam-se dos índios sem lhes fazer nenhum mal. Se os filhos fossem do sexo masculino, eram sacrificados ou enviados aos pais. As meninas eram educadas para a guerra. A soberana chamava-se Conhori. Em suas terras havia cinco grandes templos dedicados ao sol, chamados caranaí, com assoalhos e tetos pintados, além de inúmeros ídolos de ouro e prata, com figuras femininas. Suas roupas eram finíssimas, fabricadas com a lã das “ovelhas peruanas”.
Realidade? Fantasia?






D. Pedro II

Imagem da Internet



Gonçalves Dias

Imagem da Internet



PARTE VI

COM QUE CRISTAL MIRAR OS CARIJÓS E OS CELTAS?



“En la vida nada és verdad ni és mentira, todo és
según el cristal com que se mira.”(Provérbio espanhol)


E com que cristal vamos mirar as hipóteses do escritor luso-brasileiro João Barcelos em seu Olhar Celta? Realidade? Fantasia?

Podemos olhar pelo prisma da incredulidade e da negação: pura fantasia. Pelo prisma da aceitação irrestrita, sem questionamento: tudo realidade. Prefiro olhar pelo cristal que posiciona, quem por ele vê, numa atitude reflexiva.

A proposição do escritor residente em Cotia é apresentada de maneira lógica, demonstrando pesquisa cuidadosa e bom conhecimento do assunto. Se não pode ser comprovada totalmente, também não pode ser simplesmente descartada. Desperta interrogações e nos leva a concordar que existem muitas coincidências.

Em relação àquela lendária ilha citada pelos celtas, o mesmo João Barcellos escreve,, em outro artigo: “Eis que a Ilha Brazil - e ‘brazil’ era um nome já utilizado entre os povos celtas quanto a uma ilha e outros povos quanto a uma madeira utilizada para tingimento (particularmente entre asiáticos desde o Século II dC), de onde ‘brazileiros’ (os que carregavam o pau-brazil), como consta da documentação espersa por vários arquivos portugueses e espanhóis (...)” É uma grande coincidência: do nome e da cor da madeira...

Outra coisa curiosa: recapitulando Frei Gaspar de Carvajal, que naquela refrega dos homens de Orellhana com os índios e as supostas “amazonas” perdeu um olho, o indígena apresentado falou que na terra das mulheres guerreiras havia cinco templos dedicados ao sol, chamado “caranaí” (palavra muito parecida com o idioma tupi-guarani – veja-se “Carandaí’ – com assoalho e tetos pintados, além de inúmeros ídolos de ouro e de prata.

E outra coisa, as roupas das mulheres eram finíssimas, fabricadas com a lã das ovelhas “peruanas”. Há uma relação com a civilização peruana e, por coincidência, os índios Carijós eram os guardiães do Peabiru, um caminho que levava às terras do Peru. Isso é fato confirmado pelos relatos históricos. Hoje esse caminho foi recuperado e, sendo lindíssimo o trajeto, tem sido forte atração turística. É chamado o Caminho de São Tomé, com grande afluência de peregrinos. Sobre ele Adriana Vera e Silva diz, em um artigo escrito para a SUPERINTERESSANTE edição 145, de outubro de 1999:

“Desde que o português Aleixo Garcia naufragara, em 1516, os dóceis índios carijós da ilha de Santa Catarina, com quem passara a morar, contavam-lhe que, no interior do continente havia um poderoso rei branco, dono de riquezas incomensuráveis. Esse rei, garantiam, explorava uma montanha de pura prata chamada Potosi. Aleixo não resistiu à tentação. Perto de 1524, acompanhado de alguns náufragos como ele e centenas de carijós, partiu. Viajou cerca de 2.600 quilômetros a pé e de canoa, abrindo para os europeus o Peabiru, a vasta rede de trilhas indígenas que ligava o litoral brasileiro ao Rio Paraguai. Desbravou florestas e pântanos e enfrentou índios hostis. Depois de uma no e meio chegou a Cochambamba, na Bolívia, a 150 quilômetos da mina de prata de Potosi, hoje esgotada. Descobriu o império do rei inca Huayna Capac, menos branco do que se supunha, guerreou contra tribos sob o seu domínio e saqueou peças de ouro.

Embora tenha sido morto antes de retornar, seus mensageiros voltaram a Santa Catarina e confirmaram os relatos indígenas. Da Europa, foram mandadas expedições para refazer seu caminho. Assim, deu-se início à colonização dos rios da Prata, Paraná e Paraguai”.
Dizem que havia vários caminhos de deslocamento entre as “cotias” carijós espalhadas pelo Brasil. Assim, pelo caminho do Peabiru, poderiam ser retiradas as lãs e a prata de Potosi para serem utilizadas pelas Amazonas. E eu, “voando loucamente”, pergunto: não seria o ouro enviado pelos Carijós das terras da Passagem, perto da Serra do Ouro Branco?

O imperador D. Pedro II encarregou Gonçalves Dias de apurar a verdade. O poeta indianista fez um relatório de 70 páginas concluindo que seria apenas uma lenda.

Para terminar o assunto, nada melhor que usar as palavras de João Barcellos:

“Nos rudimentares afazeres dos Povos da Floresta amazônica, como nos castrejos europeus, a alma telúrica forçou-os a um olhar multi-dimensional, esse que em Sagres aquele príncipe português lançou além e por aí quis saber do Mundo que outros povos já haviam tocado pelo registro de velhas cartas de marear. De certa maneira, o príncipe refez rotas velhas para levar Portugal e o templário desejo aos mares antes navegados, da mesma maneira que os carijós refizeram a sua história sertaneja ao mostrarem a imensidão continental da insulla brazil àqueles europeus em caravelas embarcados”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário